Crônicas ilustradas 3

Terminada a 8ª série, saímos de Pinhais e fomos morar no centro de Curitiba, ali naquelas casas da Rede Ferroviária, hoje, dentro do pátio do Shopping Estação. Literalmente, do outro lado da rua do CEFET, hoje, UTFPR.

Com 13 anos eu havia entrado no curso técnico de Eletrônica. Aí fui procurar uma escola para aprimorar o violão. Caminhando pela Av. Luiz Xavier (a menor Avenida do “mundo”), vi num poste um cartaz de lambe-lambe anunciando umas aulas no Ed. Tijucas, entre a mulher que “traz-a-pessoa-amada” e o velho que compra ouro…

Era uma salinha dividida por duas cortinas onde três pessoas tinham aula ao mesmo tempo com o mesmo professor. Um filho-da-puta que eu já esqueci o nome e que me fez perder 8 meses de vida estudando pelo Método Mascarenhas de violão clássico.

Como eu estava aprendendo – apesar do método – todo mês ele me pedia pra comprar um jogo de cordas importado e se oferecia para trocar as cordas do meu violão. E todo mês, a mensalidade subia… Lógico que meus pais não aguentaram pagar e meu pai me mandou procurar uma escola pública de música.

Eu sempre chegava cedo porque gostava de ouvir as aulas, e nessa que seria minha última vez, um outro aluno me falou de uma tal de “Belas Artes” que ficava ali perto e era pública. Dei uma sorte danada porque estava bem na época das inscrições. Tive minha última aula e fui fazer minha inscrição sabendo que, se não passasse, teria que abandonar a música.

Era um prédio antigo e mal cuidado, mas a atmosfera, o som ambiente era incrível. Piano, violino, umas mulheres gritando (canto), flauta… fiquei impressionado. Lembro que pensei: Nossa! E nem é dividido por cortinas… o som passa pelas paredes… Feita a inscrição, fui pra casa e me tranquei uma semana estudando violão e “teoria musical”.

No dia das provas, você saía da prova de Teoria e ia para uma entrevista com um dos três professores: Orlando Fraga, Chico Mello e Norton Dudeque. Aleatoriamente, por ordem de chegada na fila. Os comentários na fila eram que Orlando e Norton reprovavam sem dó…; todo mundo estudando sua “peça de confronto” e eu nem sabia o que era isso. Mais uma vez, tive sorte. O único compositor da banca foi meu examinador.

Caí com Chico Mello, que me perguntou as coisas de praxe e me mandou tocar. Eu que nunca tinha ouvido falar em Sor, Carcassi, Carlevaro; não sabia UMA escala e NENHUM arpejo, toquei uma música própria. Aos 14 anos ingressei no curso básico de violão da EMBAP para ter aula com Chico Mello que durante dois anos, me deu aulas de não-violão e eu sempre lhe fui muito agradecido por isso. Aprendi a compor, aprendi harmonia, estética e o violão era só um instrumento para que a música acontecesse.

Meus pais ficaram muito felizes e me deram um disco do “Toco Preto” um cavaquinhista popular na época… quando eu falei que o presente estava equivocado, meu pai trocou por um de Dilermando Reis. Uma coisa importante de lembrar é que naquela época (quase a pré-história) não era fácil achar discos de violonistas e nem partituras.

Chico era um professor muito dedicado e promovia aos sábados pela manhã um encontro dos alunos para ouvir música. Ele trazia os seus LP’s e ficávamos ouvindo a manhã inteira. Quando alguém tinha alguma partitura, ouvíamos acompanhando a partitura. E isso não fazia parte das obrigações dele. Quando alguém conseguia comprar um disco, levava no sábado e era uma festa. Durante muito tempo, só tive um disco de violão, e nem era bem clássico… mas foi nestes encontros que conheci Julian Bream, Leo Brower, Turíbio Santos.

Lembro de ter ido na casa de meu avô com o violão e o disco abaixo, informar “seu João” que eu tinha decidido ser músico. Veja o que é a Sincronicidade: ele me deu um “crock” na cabeça e me disse muito sério: – Se quer ser músico, pelo menos aprenda um instrumento decente. Me mostrou sua flauta transversal (que hoje está comigo) e disse que aquilo sim, era um instrumento ‘decente”.

Capa de Indelibly Stamped – Supertramp 1971
Capa de Indelibly Stamped – Supertramp 1971

Mal sabia ele que Travelled, a faixa mais famosa deste disco e Aries a última, tem solos de flauta impressionantes. Eu que não entendia nada de Jung, nem de sincronicidade, e que tinha comprado este disco só por causa dos peitos, quando ouvi o disco, entendi que aquilo era um sinal…

Mas minha história com a flauta, eu conto mais pra frente.

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